terça-feira, outubro 28, 2003

Av Almirante Reis

Desço a Av.Almirante Reis, hoje, no meu carro preto, com ar condicionado, sem letreiro a dizer para onde vou, vejo a Leitaria Lisboa, o Talho dos Pardais, a pensão Estrela.

Desço de um carro que esqueci, vejo com tristeza os eléctricos amarelos, sinto a sujidade da rua, o cinzento do céu, aproximo-me da casa onde nasci e onde vou voltar a viver, vou voltar para a escola. Tenho sete anos, já não tenho pai, mas ainda não sei, não sei que vou voltar ali anos mais tarde, vou voltar pela terceira vez aquela casa, onde hoje só habitam fantasmas.

de toda a algazarra dos anos da avó, restam poucos, resto eu que desço a avenida entre muitos carros, sem eléctricos. Hoje não tenho bata branca para ir às aulas da 3ª classe, vou confortável num blazer em estofos de pele, com um volante nas mãos diferente do volante de plástico com buzina e uma alavanca que simulava as mudanças ao volante; não sei quantas, mas não as seis velocidades que posso manipular no meu carro preto.

Não vai ninguem comigo, não de certeza o colega que morava na Rua dos Anjos, e tinha um ar magro e que queria ir para o Técnico. Pode não existir na realidade da AV Almirante Reis, mas mora nas minhas recordações, se não for em mais lado algum. Aposto que morreu exilado em Macau, ou terá sido um pintor que decidiu ir viver para Lagos? Ou terá agora sido despedido de uma fábrica que deixa o país para se deslocalizar? Ou estará a dar aulas para os engenheiros como ele? Ou estará enterrado em Kuala Lumpur, onde tentou a sorte como jurista de um banco inglês para onde foi depois de ter casado com uma inglesa que conheceu no Bora Bora, na mesma Av. Almirante Reis?

Não sei nada da realidade dos outros, mas sei tudo sobre como é possível viver, sem perceber muito bem o que mudou na Av Almirante Reis.

quinta-feira, outubro 16, 2003

A outra face da lua (II)

Foi o Único í­dolo que eu tive: levantava-me da cadeira, falava sozinho com a televisão, ficava triste quando ele desistia, despistava, errava no minuto em que tudo parecia decidido: fui vê-lo ao Estoril, nunca o vi ganhar aí, mas via como ganhava a pole e me fazia arrepiar. Não ligava a automóveis desde a colecção de Matchbox e Dinky toys. Não voltei a ligar nenhuma.

Um ídolo é como um pai que se idolatra sem saber porquê, da mesma forma que se é do Benfica, sem saber porquê, mas sentindo.

Tambem ele rompeu com o i­dolo fabricado e cauteloso, que vigorava e vigora com o alemão antipático e pretensioso, representante bem grande de uma industria que se alimenta do tabaco .

Correr depressa mata! poderia dizer o unico i­dolo que vale a pena lembrar

Ayrton Senna



A outra face da lua (I)

porquê Caravaggio ? porque rompeu com a pintura simplista, mesmo brilhante, figurando homens pecadores, redenção, penitência, submissão, halos a dar com pau (nas madeiras cravadas da pintura medieval), santos de pés limpos, cruzes, cruzes, Cristo, Cristo.

"O que as mulheres querem" é com Caravaggio a ruptura com a pintura conformista e a continuidade ameaçadora da Renascença.

Daí a ilustração com o que "as mulheres querem", medusa e judith, ameaçadoras ! cupido, a seta gordurosa, o corpo desajeitado e de sexo limpo e pequenino, algo entre a diferença do sexo e o sexo diferente. Fantástico !

Ele já sabia



Inimigos fidagais

Fígado, estás aí? Não sei se existe, só vi fotografias, mas dizem que resiste a sumos de laranja e whisky com uma cara de poucos amigos (cara de quem conhece maus amigos, se conhecesse bons amigos diria cara de nenhum amigo, isto era um á parte, não liguem)

Como posso saber ? É grande e castanho ? Não diz nada, nem o espelho revela qualquer sinal, vejo apenas umas marcas de sol, enquanto acabo o banho, mas não deve ser ele a protestar. Então se ele não diz nada deve ser um assassino obscuro, já que dizem que me vai matar em breve. Mas se não consigo falar com ele, nem há sinais visíveis não sei se devo tornar.me seu inimigo e odiá-lo, ou se o acalme com um cohiba e um bushmills.

Sem gelo

chuuuaaakkkkkkkk !

Intervalo para mandar um beijo à pato Donald ( ou será Roger Rabbit ?).

Será que vou poder passear com um desenho animado pela baixa do Porto ? à procura da casa da Música, com um camartelo para dar cabo dos predios que se vão erguer à volta. Vou passear os "sobrinhos" ao parque da Cidade, deixar cair a luz sobre o mar, deixar-me fotografar com eles, envolto na bruma do fim do dia. Não sei mais que fazer com este desalento, até os bonecos animados parecem reais, leio um artigo sobre universos paralelos, afronto a Academia portuense, chamei-lhes académicos ( uma espécie de ofensa se dita de certa forma...), não estarei a esquecer a minha universidade ? Apetece-me voltar a Breton, a Eluard e todos os que se cansaram cedo desta farsa, percebendo que acaba depressa.
Leio algures que depois de tudo acontecer voltamos a ter o nosso bem estar acima de tudo; para alguem não foi assim sempre? Este sentido de que parece já ter tudo acontecido, foi como foi, já não tem mais nada para ser.

Ah, sim, o sentido da vida! deixar a nossa fotografia nas mãos de alguém .

terça-feira, outubro 14, 2003

O que as mulheres querem (VIII)

Um jovem virado para as artes, a música, um artista que diga as loucuras que só aos artistas é permitido, eis o que elas querem, as jovens que se rodeiam de imberbes ! Com asas e com golpe de asa ! com um sorriso do qual possam dizer às amigas: é malandreco, querendo significar as liberdades (não) tomadas por debaixo das saias; não interessa mais nada, não há muito mais que este tipo de mulher queira.

Nem podia querer, vendo bem !

O que as mulheres querem (VII)

A mulher sabe que tem reconhecimento por parte do pai, mesmo que esse seja um facínora que tenha comido a sopeira em hamburgers, ela pode sair da relação de uma forma eficiente e fulminante ! Senta-o á mesa, faz-lhe a cama, lava roupa, engoma, e telefona sempre ao paizinho. Um dia este, que nunca gostou do genro, pede à filha que o liberte da influencia perniciosa de um homem que é servido por ela !



O que as mulheres querem (VI)

Retrato de amigas que consentiram expor-se para este modesto blog. Medusa que prometeu imiscuir-se na mente de qualquer homem, sabe tudo o que o homem quer, e faz uma cara de espanto como se nada soubesse. Perigo laranja

segunda-feira, outubro 13, 2003

O que as mulheres querem (V)

Reacções imediatas e entusiastas pedem-me para mudar o nome deste blog para " o que as mulheres querem" com especial dedicatória para as que pensam que os homens apenas querem uma coisa !

Provar-lhes que não é verdade é a nossa missão: nós não queremos apenas uma coisa!

O que as mulheres querem (IV) ou "como este blog se transformou num narci­sico e impudico macho-blog"

Algumas simpaticas e nada alcoviteiras meninas decidem subitamente dizer-nos adeus da maneira mais evidente que existe ( como nao nos passou isto pela cabeça, homens de Deus!): e dizem:

- Sei que não gostas de mim e por isso vou fazer uma grande reflexão
- Estou muito confusa, não compreendes nada do que faço por ti
- Vou voltar para o meu antigo namorado; assim terei a certeza
- Sim , ando com outro; mas só para ter mais desejo de ti
- Não conheci ninguem como tu; por isso não te mereço e ... ele prometeu ficar sempre comigo. Desculpa, ta?
- Quero-te, mas isso é demasiado para mim; És muito possessivo (gosto especialmente desta frase, tomar posse, eu abaixo assinado, juro pela minha honra que cumprirei com lealdade as funções que me são confiadas)
- Como posso confiar em ti ? Como posso ter a certeza de que nunca me trairás; vou sair desta relação (tb gosto muito desta, a relação, uma verdadeira instituição, normalmente dita em circunstancias semi-tragicas, com lagrimas, um olhar de basset e as mãos cruzadas á  frente do nariz
- a nossa relação assim não vai a lado nenhum, outra difi­cil de engolir depois de termos apanhado um avião para Praga, na esperança de passar do passeio nas Docas para um romanceado passeio em terra do livro de Kundera que ela disse ter lido.
- De quem era essa mensagem ?

meus caros amigos, peço-vos em nome da solidariedade masculina que contribuam para esta missãoo de denuncia do poder mulherio, dando-me frases onde consigamos provar a lugrube missao das mulheres na terra, para alem de dar à luz, quase sempre inoportunamente.

quarta-feira, outubro 08, 2003

Eis um homem

Hoje é mesmo o dia mais importante, não pelos ditos de ontem, aparentemente premonitórios, mas porque as razões da mancha branca de que se falava cairam estrondosamente perante a justeza da decisão que volta a dar credibilidade á justiça portuguesa. E se pouca gente percebeu, aquele homem fez sacrifícios pessoais que muito poucos estão em condições morais de fazer.

A bem dos que sofreram e para castigo dos que ainda não o sofreram devidamente.

terça-feira, outubro 07, 2003

The moon is a harsh mistress

Subo para o autocarro, e subo a mensagem intima para outros lugares sem ruido, mas com vento que anime as minhas velas, que chegue a quem escrevo mas mal conheço, a quem ouvi mas não vi. Isto chamaram uns poesia, outros abstração patética, mas ninguem pode saber o que podem as imagens imaginadas, as que de repente fazem de um nevoeiro um ser, que se descobriu no meio de quase nada, uma hipótese ténue;dessa força se confundem palavras e muita vontade. Atirem pedras, sempre será assim, até mesmo a eternidade confessa a sua incompreensão.

Para hoje, que acabou, ser um dia com data; não, hoje ainda não foi, amanhã terá data, será assim lembrado o dia, e se não for amanhã será um dia, outro dia.

segunda-feira, outubro 06, 2003

A whiter shade of pale

que marcha fúnebre aconteceu em Lisboa? Quem desceu à rua ignorando que juiz é a força da lei e não a sentença antecipada? Quem pretende agora tudo saber quando nada soube ou quis saber antes do escandalos jornalisticos ? Não é confortável viver em sociedade crispada em vontades ateadas tão artificialmente.

A mancha branca torna-se suja porque reduz a verdade ao clamor das vontades reprimidas e vampirescas.

Valha-nos por enquanto o Jorge, outro de quem vamos ter saudades, em breve.

domingo, outubro 05, 2003

A depressão

Para mim está sempre em dúvida a justiça dos loucos. A quem joga com a "depressão" e tenta ganhar o estatuto de louco, devem os pobres "normais" responder com uma indiferente palmada nas costas. Afinal depressão significa baixa pressão, uma força que tende a jogar os ares das baixas para as altas pressões. Com pouca pressão o deprimido tende a ficar calmo e caminha para a alta.

Não sei se deva invocar este estatuto de louco, para ter mais desculpas para ignorar os outros, ter uma baixa médica para poder finalmente por em dia o backlog de livros e outras actividades, enfim poder fazer o que a imaginação deixar, intervalando com momentos de lucidez (vêem, ele até tem momentos tão excepcionais...) para justificar o estatuto.

Sei que não tenho esta habilidade, mas deixa-me quase deprimido esta capacidade de alguns gritarem que querem voltar a ser crianças e reclamam por quem trate deles. E têm público.



quinta-feira, outubro 02, 2003

Era uma vez na América

Se memória desta vida se consente, não se perca por razão alguma esta espécie de bloco de cinema puro, onde se olha para trás e para a frente de umas vidas.

Exactamente como passamos os dias a fazer, não é?