sábado, dezembro 27, 2003

Empalideceu

quando me viu. Não deve ter acontecido diferente comigo; na passagem de peóes vi-o passar entre outros, enquanto o meu carro verde parava, com outros ao lado, mesmo ali antes de entrar na Rua do Ouro.
Por momentos pensei estar no limiar do sono, quando imagens e vozes se trocam com as letras de um livro e as horas se vão perdendo, nesse exacto momento em que as dúvidas da existência são mais vivas; ou talvez ainda nesse exacto momento em que acordamos e lutamos para perceber onde estamos e rapidamente recordar o mundo inteiro outra vez: no limite da loucura portanto.
Mas não, não era aí que eu estava, para ser rigoroso eu estava ali dentro do carro, mas também fora dele, a atravessar a passagem zebrada, talvez fosse uma confusão qualquer entre as listas brancas do asfalto reflectidas nalgum espelho ou montra.
Não tive tempo de perceber mais: o carro arrancou e entrevi-o outra vez. Sei que me viu.

Estou ainda parado em frente a uma montra, olho o reflexo e parece-me que estou no mesmo ano em que acordei, ainda estamos em 2003. Mas aquele carro em que eu ia vai demorar muito mais tempo a chegar.




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