domingo, julho 25, 2004

The end of this affair


A pretexto de um acidente "informático" que afectou o domingo de hoje, em que me cansei de escrever templates e a palavra "pickpocket", após um ano e 5000 visitas, muitos comentários e bocas, acaba aqui o Pickpocket.

Na pouca transparência de alguns posts se reflectiram alguns maus momentos, pequenas crises e maus humores do autor. Alguns ficaram amenizados pela escrita digital aqui feita como se explodissem para os oceanos, outros nem tanto. Uns causaram impressão. Outros não.

Aqui ficou a experiência de um romance escrito que se completa noutro lado, aqui ficaram os ecos de outros, esses sim, vividos.

Daqui se partiu para conhecer outros que usam estas formas púdicas e públicas como uma das formas de se expressar.

Quem reler o que aqui escrevi e que descubra também o que não consegui dizer melhor, faça disso um presente meu.

O autor continua, noutro blog, que ele espera que seja mais bonito. Num blog ou num pedaço de papel tudo se pode escrever, com a restrição simples de não deixar o papel ou o ecran em branco !

Vou terminar com um poema de António Gedeão (o ultimo de um dos seus livros) e começarei o novo blog com o primeiro poema desse mesmo livro .




Poema de andar à roda

E nem podia ser de outra maneira

Como as ondas do mar que vão e vêm
pela atracção da Lua
outras ondas se alteiam, atraídas
por outras luas, satélites do rosto.
Enquanto umas de amor cobrem as praias
e as penetram de espuma
estas não amam, não molham, não se esgotam.

Mudam de cor, apenas.

sexta-feira, julho 09, 2004

Sinal para os tempos que não falam


Talvez seja sina. Isto é sinal, um mau sinal, ou pelos menos é sinal de que se escrevo é para não falar.

Para não falar, só porque não há ninguém para falar. Ou todos os que há para falar não são os que eram necessários para ouvir o que houvera eu querido dizer.

Assim, venho aqui e escrevo, escrevo que parto hoje, não falando. Toda a gente parte de todo o lado para todo o lado, e o animal que me transporta já trouxe outros que partiram para aqui. Tal como eu saio daqui cruzando-me com eles, eventualmente poderia cumprimentar um passageiro ou outro, ou mesmo interpelá-lo: veio de lá? porque vem para cá? eu vou para lá !

Assim, venho aqui e escrevo, sem saber se alguem lê, apenas para não falar. Para não dizer a quem poderia não querer escutar, e assim se perder a possibilidade de eu entender, porque o que dissesse não faria ricochete e não haveria a volta das palavras de resposta que nos fazem entender porque falámos assim ou de outra forma qualquer.

É sempre outro o tempo, é mesmo uma banalidade escrevê-lo. Mas em cada tempo que é outro, se olha para outro tempo cheio de momentos: parece ver-me ali infeliz, no outro tempo, naquele tempo, mas se o sentia então agora parece-me um tempo mais doce, quase infantil. Porque o outro tempo que não é o de hoje, qualquer outro tempo, é um tempo tranquilo porque resolvido.

Tal como se folheia um livro que já se leu até ao fim, de que se sabem já os segredos, mas em que lemos passagens de um momento, saboreando a emoção daquelas páginas, sabendo embora o seu desenrolar e epílogo.

Não há portanto tempo de momentos infelizes, da mesma forma que não há agora tempo de momentos felizes.

Heads will roll (II)


Who knows: perhaps eyes form in space
and look on everywhere (Rainer Maria Rilke)



Caravaggio
Salome with the Head of the Baptist c. 1609
Palazzo Real, Madrid

quinta-feira, julho 08, 2004

Para acabar de vez com as eleições


eu por mim passava bem sem eleições. Para quê? se estamos tão bem no poder, podíamos mesmo anular o método e passavamos a eleger o 1º primeiro ministro em Conselho Nacional, sempre. Bem eu até nem me importava de ir a votos, mas só se tivesse mesmo a certeza de que era eu eleito, assim só para saber se era muita gente a votar ou não. Mais nada, porque eu tenho a certeza de que o interesse nacional precisa de mim e dos meus amigos para estar sempre no governo. A governar, a governar-me, a governar a casa punha lá uma gaija boa, as outras eram assessoras, uma espécie de vassouras de gaijos incómodos. Punha até uma cabeleireira só pra elas. As eleições não fazem falta nenhuma, e a prova é que houve até uma grande abstenção dos meus amigos e conhecidos nas últimas, que era pra eleger uns gaijos pra europa, o que também não é mais preciso proque tá lá o Zé manel. Se a malta conhecida não foi aos votos e daí não veio mal ao mundo é porque tenho razão. A chatice que são as eleições e o dinheirão que isto nos custa não valem o trabalhão que nos dá. Também os jornais já pouco mais dizem, a não ser que estamos todos de acordo. Poupávamos em jornais, poupávamos em informática, que esta maquineta dos votos só dá dinheiro a gaijos que mexem nos botões e depois aquela porra encrava imensas vezes. Eu sempre disse que não achava bem ter tanta rapaziada a mexer nos computadores que só trazem custos e afinal pra quê ? Têm a mania que sabem o que a gente quer, mas depois fazem coisas que a gente não percebe e ainda ficam com ar de mal dispostos.

Temos muito pra mudar no País. Isto são só ideias base.


Bittersweet


1. Amanhã o PR vai convocar eleições. Não sei porque lhe chamam antecipadas. Parece-me que antecipámos a necessidade de eleições, por isso o que é antecipado é a sua necessidade.

Jorge, ainda bem que não tens medo da direita desgovernada e, que diabo, se houver manifestações contrárias é nas discotecas !


2. Amanhã o PR vai dar uma segunda oportunidade à "maioria". Parece-lhe que a "estabilidade" é mais importante



Jorge, então tu vais passar 10 anos a dizer " segurem-me que eu dou cabo deles'"? Não vais, pois não ?

quarta-feira, julho 07, 2004

O livro gordo


A garantia de que outros reconheceram "que é bom"
Tem 540 páginas mas não importa porque "se lê muito bem"
Não é preciso experimentar porque "é garantido que não se consegue largar"
Compra-se como um seguro de leitura !

A garrafa tem dois aspectos: meio cheia ou meio vazia.

Os livros gordos que fazem sucesso fazem-no porque de repente ganham um libelo de qualidade associado a uma facilidade de leitura; é isto que atrai as pessoas. Pelas margens ficam as fantasias de Marion Zimmer, as aventuras de Harry Potter, os pastéis de Robin Cook, bla bla bla. Este epicentro de leitura "boa" e "fácil" tem justiças e injustiças.

Nas pontas "boas" ficam o início com o Nome da Rosa de Umberto Eco, e a última saliência em Portugal com o Equador do Miguel Sousa Tavares.

Sim , é o Código da Vinci de Dan Brown, leia-se pelo espantoso ritmo da escrita, pela montagem dos capítulos, milimétrica. E acima de tudo porque está meio mundo farto de histórias de santinhos.

Mas vamos a um desafio: quem quer ler o Fantasma de Harlot (1100 pgs) de Norman Mailer ?. Eu li-o na piscina do Hotel Polana em Maputo, em poucos fins de semana, para espanto dos palermas da embaixada americana que nem sabiam do que tratava ! Mas isso são detalhes. A história da CIA, dos Kennedy, de Marilyn, de Cuba está toda ali, e diz muito mais sobre a América do que duzentas mil crónicas politizadas publicadas nos ultimos 15 anos. Como Philip Roth, na Mancha Humana. Livros gordos e apetitosos.




Virgem dos Rochedos - 1483 (Museu do Louvre)
Da Vinci

Raros são os dias (XVI)

Luanda





Agora olhava pela janela do 7º andar, muito tempo depois de tudo e muito tempo antes de poder esquecer a angustia de manhã, a angustia dos locais, todos os que eram reconheciveis, mas também todos os que eram novos e que ela não poderia sentir. Viu a manhã de Luanda, com pouco sol, uma névoa insistente, um cheiro do café, sentou-se na cadeira de verga a olhar mais um pacote onde espreitavam as pontas de uns dentes de marfim, que os habitantes temporários daquela casa (a casa de trânsito, como lhe chamava a empresa que a alugara) compravam furiosamente sempre que se deslocavam a Luanda, a par de bijuteria e artesanato; tudo barato, diziam, com a ideia de decorarem a casa de férias com máscaras indigenas, inundarem a mulher e amantes com anéis de marfim, de jade, cinzeiros de pau-santo para oferecer no Natal, gastavam dólares que o Fonseca, motorista e guia dos locais de compra clandestinos, nunca ganharia em anos de trabalho. Olhou a rua da Missão, demasiado perto de onde ela fora assaltada, demasiado perto da memória que o levava para longe dali, para a praia das Palmeiras, ondas gigantes e quentes, a praia despovoada, um pescador de lagostas com uma tanga desbotada a dizer Arena, e ela, com um fato de banho preto, subido nas ancas que a transformava numa nova deusa de pele escura, mistura de séculos de portugueses com angolanos que os unia de uma forma ignorada pelos perplexos relatores da guerra e da ante-guerra e do pós-guerra, e que alguns escritores angolanos e mesmo brasileiros cantavam e acentuavam, sem eco em Portugal. Olhava a Rua da Missão, mas via o vermelho da terra e os imbondeiros descarnados de braços levantados com pedaços de fruto negro pendurado, a saudade de voltar a casa no Domingo, depois da praia vestir a camisola branca de alças e os calções de caqui e as chinelas de cabedal escuro, o cabelo penteado para trás, o bigodinho recente, depois de um banho no chuveiro do pátio com os outros e as conversas com o pai, sentados nos bancos de madeira enquanto a mãe assava frango, com um avental de flores sobre um vestido beije, cabelo apanhado, um pouco eriçado, como o do pai, como o seu, como os seus olhos verdes que despertavam a malícia das mulatas do pátio, herói de dois golos marcados ao Pita, guarda redes, na eliminatória memorável contra o Petro Atlético, final de juvenis, arbitrada pelo namorado de Laura, mais velho, um gajo meio portugûes, manda chuva da federação, coisas do colonialismo.

Não voltara a entrar na casa da Maianga, não voltara a transpor o portão de ferro. Da janela do 7º andar conseguia ver a Maianga, mas não a casa onde um dia entrara com ela, entre promessas de arranjos e obras nunca feitas, portadas brancas entre buganvílias, pedra até à porta principal, uma sala em baixo com uma estante do pai com gira-discos onde se tocava Sinatra a 78 rotações, dançara com ela the summer wind. Dois quartos em cima uma escada simples sem corrimão, o estilo colonial português de sessenta.
Passara pelo Sahara tantas vezes, tantas vezes sonhara conhecer o deserto sobrevoado, a savana, os rios, as travessias de séculos entre África e Europa, olhar com emoção Sagres e o Cabo, e os regressos para a terra vermelha. Parecia-lhe agora tudo impossível, focou o olhar no vidro, encostou a cabeça e deixou-se levar pela angústia outra vez, imobilizou-se, não era preciso parar o tempo agora, devia acelerá-lo, voar dali para outro ser, tomar outra forma, apagar pedaços do cérebro, trocar de alma, voltar a Lisboa e misturar-se no metro a ouvir os outros, passar a alma angustiada para um desconhecido qualquer, agarrar outras emoções, rir outra vez, esquecer-se dos livros e da musica, ter lido outros livros, ter dançado outra música, trocar de passado, encomendar a alma ao Diabo, um pacto de servidão com o anti-cristo. Desejos de ruptura e focou sem querer o soldado que fazia a ronda com a arma ao ombro. Quem poderia ter desfeito tudo com um tiro, poderia ele roubar uma A47, desejava-o agora, infiltrar-se nos muceques, pagar a quem fosse preciso para saber, vingar-se de quem lhe roubara tudo. Nunca o faria, sabia-se desajeitado com armas e raquetes de ténis, poucas vezes andara ao murro. Saiu desesperado, nem o diabo o salvaria.

domingo, julho 04, 2004

After the fall

Como antecipado pela voz dos deuses, o mito terminou :

Mythos


Mythos: o que não pode realmente existir, segundo os gregos. Ou, segundo outros, o que aconteceu pode repetir-se, pelo poder dos rituais. Por se contar a história, o mito, uma e outra vez.


Por desafiar a vontade de Zeus, Prometheus foi amarrado a uma coluna onde uma águia vinha debicar-lhe o fígado. Todas as noites voltava o fígado a reconstruir-se e de novo voltava a águia no dia seguinte para o comer, para sofrimento do mártir.
Mas a ira de Zeus atenuou-se e deixou que Hércules abatesse a ave, glorificando-se e atenuando o sofrimento de Prometheus. Este permaneceu cativo, no entanto, porque não há perdão para quem afronta Zeus.

sexta-feira, julho 02, 2004

Raros são os dias (XV)


Luanda



Ao tentar parar a realidade que estava ali a bater-lhe com força desqualificada, ao tentar olhar sempre mais para trás, ao tentar somar os 34 anos de vida com os 34 anos que levaria de novo até chegar ao princípio, que apelaria a qualquer potestade para que fosse um fim, viu o rosto de Laura bem junto ao seu, uma carícia de ambos, que juravam alguem jamais ter feito, encostavam a face enquanto a mão deslizava pela outra face . Viu e percebeu que o veria assim até ao fim dos tempos, que ela teria sempre 27 anos, que os seus cabelos não embranqueceriam, que as rugas nunca apareceriam, que nunca deixaria filhos, nunca viajaria para além de Luanda e Lisboa, pareciam mesmo juntas, como se o mundo pequeno se reduzisse a Telheiras e à Maianga, com idas a Belém comprar pastéis, rir com ele no átrio do CCB, ver os filmes nos ecrans pequeninos do Quarteto, tomar chá na pastelaria do Pedro Simões, rir sempre na discoteca Kunda, com fumos e ouvidos a estalar pela manhã de Lisboa. Percebeu que não ia poder parar a realidade e pôr a vida a andar para trás, e caiu para cima dos policias magrinhos, cortando as frase arrastadas e timidas com que tentavam dizer o que ele já tinha adivinhado mesmo antes de baterem á porta, mesmo quando o carro verde subia a rua e parava entre fumo espesso junto ao portão onde brincavam as crianças com esperança. Acordou e a angustia demorou só 5 segundos a aparecer, estava na cama, em pé os vizinhos a contar o que não era preciso contar, a chorar pelo que ele ainda choraria e não tivera lucidez para fazer, vozes inesquecíveis, vozes que tentaria mais tarde recordar melhor.

Pouco tempo depois de ter olhado a rua e visto o carro verde que se aproximava, e com ele a vida que não andaria para trás.




quinta-feira, julho 01, 2004

Wat is dat ?


A presidência europeia é da Holanda, apenas duas horas depois de terem sido espremidos por nós, e apesar do nosso coração pequenino ter batido mal, como sempre

Nem sei porque acho isto tão importante, mas esta safadeza do Jose Manuel Barrosso de desligar do PSD e avançar para CEuropeu tem dedo do futebol. Não interessa se é muito importante ou pouco, mas alguém passou a ganhar, quando costumava perder (veja-se o post sinistro deste Pipo, lá mais abaixo, para o confirmar), alguem veio para a rua, e não era coisa que se pensasse fazer, alguem comprou bandeira (sim a do Expresso, claro), e não tinha imaginado fazê-lo, alguem ficou rouco depois da televisão ter dito que o árbitro apitou para o final do jogo. Pela 4ª vez !!!

Não me falem em depressão nacional, que nem sei o que isso é, a não ser que foi inventada pelos jornais, não me digam que "só este país" , porque não se pode confundir os duros com o durão, nem me digam que no dia 5 de Julho volta tudo ao normal. Na rua eu falo com todos e rio para todos, todos os meus tiram fotografias com os teus, todos dançam a pimbalhada mais reles que tocar, todos cantam o hino nacional.



Ei ! you intellectual giants ! Here is a piece of pure social science !

Van ...... quê ??????

A equipa de Van's foi descascada esta noite, os queijos comidos e não se fala mais deles.

Não sei dizer nada em Holandês, por isso aqui vai uma lembrança para a primeira noite da presidência europeia da holanda:

Não levam a taça mas levam um Durão Barroso.